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Mostrando postagens com o rótulo Abracei

Um grito silencioso

Passam por mim e não veem. Me olham e não me enxergam. Não me ouvem. Não me conhecem. Não me sentem. Não se aproximam. Não sou o vento. Não sou Amor. Não sou partículas em suspensão. Não sou uma campanha publicitária na internet. Não tenho cor. Não tenho nome. Não sou cidadão. Não sou uma frequência de rádio. Não sou barulho. Não sou vida. Dia desses perguntaram quem eu era - curioso, não?! Sou o canto da sarjeta. Sou 16 milhões de brasileiros. Sou moeda quente. Sou um olhar pelo canto do olho. Sou 3,1% dos jovens deste país. Sou o esquecimento dos políticos. Sou a desigualdade social. A concentração de renda. Sou pão velho. Roupa furada. Uma ajuda, moça, um prato de comida, por favor? E lá se vai a moça fingindo que não é com ela. Que não ouviu direito. (Só mais um bêbado vagabundo!) Sou doente terminal há mais de 20 horas na sala de espera. Sou falta de saneamento básico. Sou sistema educacional precário. Sou um país inteiro. Sou filho de uma nação [fantástica?]. Sou carna...

O grande mito do "felizes para sempre"

"A cada dia que vivo, mais me convenço de que o desperdício da vida está no amor que não damos, nas forças que não usamos, na prudência egoísta que nada arrisca e que, esquivando-nos do sofrimento, perdemos também a felicidade." Amo Drummond e não é de graça - ele faz por merecer. Excessos literários e purpurinas à parte (coisa rara de se ver por aqui, confesso), venho apresentar minha opinião sobre o grande fantasma do felizes para sempre que a sociedade nos enfia pela garganta e a gente acaba se deixando engolir. Então se prepare, porque lá vem. Delete do pensamento a sensação de que amor só é de verdade quando se mistura com paixão e envolve duas pessoas.  Não é assim. Aliás, esse tal amor carnal é uma das variações do Amor Maior (sim, em letra maiúscula!) e não, ele não é o segredo da felicidade. Esqueça os filmes e os livros e a mídia e toda a ideia de que o futuro traz felicidade. Ele não traz.  O para sempre também não é o segredo da felicidade. E devo mencionar que...

Carta à surpresa

Das milhões de coisas que poderiam passar pela minha cabeça quando o avião decola, a que mais me fascina é olhar para as luzes e imaginar o que estariam fazendo as pessoas debaixo delas. Estou olhando pela janela agora e caramba!, você iria adorar esta vista. Iria rir comigo dos pontinhos acesos, me perguntaria quantas pessoas eu acho que existem lá embaixo, se elas estão se arrumando para alguma festa e, caso estejam, se ainda dá tempo da gente descer e ir junto. Acho que felicidade é também um pouco disso: deixar-se surpreender. A gente vai perdendo essa capacidade com o passar do tempo e é por isso que queria você aqui agora. E que dorzinha no ouvido, hein? Você estaria reclamando dela agora. Talvez chorando. "Tô com fome". Essa ansiedade de quem não tem hora marcada pra nada, mas mesmo assim quer tudo ao mesmo tempo agora e para o último segundo. A gente vai perdendo isso também. Se eu pudesse devolver o livro que ajudava a realizá-lo mais rápido... Aliás, se eu pudess...

Let's have the time of our lives!

     Querer é não se esvair de tentar.      Perdoar é não se findar de amar.      E amar, amar mesmo, é um incansável agradecer.      Pedir é o caminho que cega o agradecer, é o que cobre o realizar.      Pedir é o problema - o grande e abominável problema do mundo todo.      Solucionando, então. Obrigada. De verdade. Por terem feito dar certo, mesmo que indiretamente. Por ter sido bom, mesmo que completamente diferente. Por tudo e por nada - é sempre bom usar antítese.      E sabe qual é a mágica? O Sol nasce todo o dia. Brota do horizonte e logo após um beijo dá n'outra ponta para que tudo possa descansar - e acordar de novo. E se fazer o novo. Re-criar, re-estar.      É sempre vida nova e ela se faz todo dia.      Por que não realizar?, s e estamos todos aqui, se somos todos agora?      Obrigada, mais uma vez. Valeu a pena. Cad...

É chegada a vida nova.

Olhe-se no espelho. Vai. Anda. Para tudo e olha. Gostou do que viu? Lembre-se de tudo o que já passou. Vai logo! Pensa. Gostou do que lembrou? E quantas vezes você sorriu? Elas superam as vezes que chorou? E quantas vezes caiu? Levantou-se em seguida? Ainda está caído? Como vai a família? Tem ligado pra eles? E os amigos? Ainda estão lá? Você ainda está lá para eles? Ainda os empresta os ombros? Ainda tem ombros a quais recorrer quando a saudade aperta? E o cheiro do verão? Ainda se lembra dele? Vai, tira esse relógio do pulso. Esquece que dia é hoje. Números, apenas. Esquece seu cartão, tira da memória a placa do seu carro. E aí? Gostou? Está mais leve? Qual sua cor favorita? Qual é o sorvete que você mais gosta? Quando foi a última vez que abraçou alguém? Abre o armário. Mas abre rápido! Antes que seja tarde. Joga isso tudo no chão. Quem é você agora? Qual a última doação que fez? Ajuda que prestou. Quando foi? Você já ...

Azul.

Provavelmente já escrevi sobre isso. Muitas vezes. E se nunca registrei em palavras, de certo já marquei no vento o que estou prestes a contar. É que há muito tempo, não sei quanto - é tempo suficiente para o tempo não ser o mais importante na história -, meu pai se sentou comigo pela janela. Pelo o que diz a história e minhas fitas de vídeo antigas, isso acontecia muito. Todos os dias após o almoço, mais precisamente. Gostaria de me recordar de todas estas ocasiões. Mas não consigo. Lembro-me, entretanto, de uma única vez, em especial. "Olha quem veio brincar com você, Carol!" Eu vejo os pássaros pela janela. O céu está do mais brilhante tom de azul. O cheiro é de verão. "Olha, Carol! Olha quem veio brincar com você!", a voz amiga repete. O que vem depois é um grande espaço vazio, negro. Não me lembro de mais nada. Mas não me magoo por isso. Ao contrário: aquela janela, a lembrança dela, deu-me muito mais do que um passarinho com quem brincar. Deu-me o infinito....

E agora, José?

(Valeu, Drummond!) Neste momento, há 6.875.870.198 pessoas na Terra. Milhares delas estão felizes agora. Planejando o casamento, se arrumando para a formatura, no cinema com os amigos. Muitas estão dando gargalhadas neste exato segundo. Celebrando o aniversário, começando um namoro. Fazendo brigadeiro na casa da melhor amiga. Outras, estão acabando de acordar. Com aquela ressaca e muitas lembranças engraçadíssimas de ontem a noite. Dentre estas, algumas já estão até com o telefone no ouvido esperando o gatinho que elas conheceram atender. Boa parte deste número está trabalhando. Viajando. Contando as horas para chegar em casa e ver que o filho mais novo aprendeu a andar. Que aquela calça serviu na esposa. Mas devo lhes confessar uma coisa: a grande maioria chora. Lastima-se pela perda da avó, a nota baixa na prova de Geometria. A grande maioria está em prantos neste exato momento, com saudade do amigo que mudou de cidade, chateada com o ex-namorado chato que faz de tudo par...

Segundo post do dia.

'Você sabe o que é o amor?' Me perguntaram uma vez. Bom, quando eu nasci, conheci uma moça que havia aguentado o meu peso durante nove meses sem reclamar, superou todas as dores do parto. E mesmo antes de ela saber se eu seria bonita, ou legal, ou qualquer coisa, ela já gostava de mim com todo o coração. E depois eu conheci um monte de pessoas incríveis, que me ajudavam na escola e saiam comigo nos finais de semana. Me abraçavam quando eu chorava e me ligavam quando eu ficava muito tempo sem dar sinal de vida. Cantavam "parabéns pra você" no meio da rua só para me fazer passar vergonha no dia do meu aniversário e riam comigo quando meu cabelo estava estranho. A eles eu dava o nome de 'amigos'. E depois de um tempo, eu conheci um menino. Ele não era o mais lindo e de longe o mais perfeito. Mas me fazia rir o tempo todo e quando eu estava com ele, me sentia leve. Era como se fosse só esticar um pouco o braço para tocar as estrelas. Ele me apertava quan...

Óculos velho

Há um tempo atrás, durante meu trajeto para a escola, enquanto passava pela Avenida Europa, um moço trajando um terno azul-marinho velho e surrado, barba já grisalha e por fazer se aproximou de mim com um sorriso meio amarelado e disse: Não está na hora de trocar seus óculos? Julgando ser algum maluco ou pedófilo (maldita mente humana preconceituosa !), saí de perto dele o mais rápido que pude e continuei minha caminhada apressada. Entretanto, o velho velho problemático continuou me fazendo aquela mesma pergunta naquele mesmo lugar todos os dias. E todas as vezes eu agia da mesma maneira: saída de perto, desviava, dava um pequeno empurrãozinho nele e continuava andando. Não está na hora de trocar seus óculos? Sempre fui muito curiosa, e quanto mais ele me questionava, mais me perguntava o porquê daquilo. Eu nunca havia usado nenhum tipo de óculos: não tinha problemas de vista e odiava andar com óculos de sol na rua. Nessas últimas semanas, fui tomando coragem pouco a pouco a...

Depende do referencial

Formiga era uma formiguinha que havia passado a vida inteira incontente com seu tamanho: ela queria ser maior, mais forte. Um dia, quando já estava bem velhinha, pensou: Não aguento mais viver com a dúvida. Preciso descobrir o segredo da grandiosidade! Quero ser maior! E assim, se colocou a caminhar. Começou pelo seu próprio quintal: - Seu Sapo, você é tão grande, faz tanto barulho! Como faço para ficar do seu tamanho? Mas quando o pobre sapo começou a abrir a boca para responder, a Árvore gritou: - Não! Formiga, não seja boba. O Seu Sapo é pequeno, fraco. Eu sou forte! Enquanto qualquer cobra ou pássaro grande pode apanhá-lo facilmente, eu continuo aqui. Firme e forte. Aguento todas as chuvas, todos os ventos! Formiga se virou para aquela árvore no mesmo instante. Ela tinha razão! Uma árvore é muito maior e mais forte do que um sapo. Então perguntou: - Senhora Árvore, você pode me dizer o segredo da grandiosidade? Eu quero ser maior! - Claro que posso, é só... Formiga já...

Auto-retrato

Sempre escrevo o que penso e o que sinto, e isso é relativamente fácil para mim, mas nunca consegui me definir com palavras. E não é egocentrismo , não, porque eu estou longe de me achar indecifrável , indefinível. Até porque algumas pessoas já conseguiram expressar por meio de palavras exatamente aquilo que sou, mesmo que não fosse o que eu gostaria de ouvir. Já faz alguns dias, talvez muitos, que venho preparando um texto com aquilo que eu, Ana Carolina Fava (e não meu "eu-lírico"), sou. Devo ser alguma coisa, porque todo mundo é alguma coisa. Mas ainda não consegui descobrir que coisa sou. As vezes me acho perdida: meu coração, minha alma e minhas entranhas me dizem que sou isso e aquilo, e de repente minhas atitudes me provam o contrário, me fazem crer no que eu não acreditava. Me pergunto o tempo todo se o que eu faço é tão diferente assim do que eu sinto, e se ambos juntos não mostrem o que eu sou realmente. Mas, como diria um amigo meu, não faz sentido. Nada justi...

Restauração

De vez em quando eu penso em escrever um texto lindo. De vez em quanto eu penso em escrever um texto maravilhoso. Um texto que cure todas as doenças incuráveis, um texto que enxugue as lágrimas de todos as pessoas deprimidas. De vez em quando eu penso em escrever uma história que liberte todos os derrotados, todos aqueles que desistiram de lutar, todos aqueles que de tanto tentar e não conseguir se encontram fadigados. Me dá vontade de criar um poema, uma canção, que encha de alegria todos aqueles desiludidos, todos os que o amor passou para trás. Um texto que coloque um sorriso no rosto mais melancólico da Terra. Mas nunca consigo. Nunca consigo devolver alegria à todas as pessoas. Nunca consigo salvar o planeta do aquecimento global, do efeito estufa, da miséria, da ambição, da falsidade. Da mentira. Nunca consigo fazer com que o céu se encha de sol todos os dias do ano. Nunca obtenho a satisfação de fazer o riso preencher o grande vão criado pelo choro. Nunca consigo fazer com q...