Carolírico

Dia desses matei um cara. E ignorante que sou, liguei e denunciei anonimamente o meu eu-lírico. Minutos mais tarde estavam na porta daqui de casa.
Você está presa em nome da lei.
Estranho, não? Desde pequena havia acreditado que uma das vantagens de ser escritora (ou pelo menos aspirante a tal cargo), seria poder colocar a culpa no meu eu-lírico caso as coisas não saíssem como o planejado.
O que de fato não seria tão incabível assim. Meu eu-lírico é permanentemente mutável: assume formas, cores, sabores, amores... Ele tem coragem de ser, estar e fazer tudo aquilo que o meu eu-eu não é capaz. Confuso, não?
Pois é. O pessoal do júri também achou.
Escrevo, logo existo. Foi esta a explicação que me deram e que agora reconheço ser suficiente.
Talvez meu lirismo não esteja tão longe assim do que eu realmente sou. Aliás, hoje acredito que os dois são muito parecidos! Provavelmente são até a mesma coisa.
O problema é que o crime fora cometido e o réu já está sendo julgado: transformei a mim - e ao meu eu-lírico - em um drogado, um assassino. Só que me esqueci de construir minha clínica de reabilitação.
Quanto mais escrevo, mais aprendo. Quanto mais aprendo, mais penso. Quanto mais penso, mais sou. Logo, começo a ser aquilo que escrevo e escrever aquilo que sou.
Começo a completar meu ser e minhas entranhas mais profundas com versos e a finalizar os mais complicados textos com sentimentos.
Dia desses matei outro cara. Mas dessa vez, não tão mais ignorante, liguei e denunciei anonimamente a mim mesma: Carol.




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Comentários

  1. Respostas
    1. Muito obrigada pelo carinho e por acompanhar o blog, Nathalia! Nem eu me lembrava deste texto mais e, agora que li, relembrei das sensações pelas quais meu pobre eu-lírico passava. Ou não seria meu eu-eu? hahahaha
      Um beijo

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  2. Esse eu-lírico anda matando e dando vida...... Matando a gente de vontade de ler o próximo e dando vida a nossa vida!! Parabéns!

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