Assim é se lhe parece

(Sonhos são estranhos, não?)
Outro dia vi teu amor passando na rua. Perguntei como ele estava e ele me disse 'cai fora'. Acho incrível a facilidade que você teve para se esquecer de mim e de tudo o que passamos juntos.
Outro dia vi teu amor passando na rua e ele me pareceu tão chato! Você já foi legal, sabia? Ainda não entendi como você conseguiu virar isso, este poço de amargura. De verdade.
Desculpa.
Outro dia vi teu amor passando na rua e percebi quatro relógios no braço dele. Todos eles sincronizados meticulosamente com o horário exatamente correto do satélite. E você olhava-os com frequência. Espantei-me: você costumava ser livre, me ajudava a voar sempre que eu me esquecia como bater as asas. Por que estaria tão preso à números?
Dia desses encontrei com teu amor na esquina. Ele me parecia aflito, estressado com alguma coisa. Havia um nó em sua garganta, um dos bem explícitos. Como se ele quisesse dizer muitas coisas mas algo o sufocava. Sua testa estava suando, como se ele houvesse acabado de chegar de uma maratona de triathlon.
Gritei. Tentei me aproximar e conversar com ele: com quanta saudade estava eu! Ele não ouviu, não me sentiu, não percebeu o meu olhar. E ainda fez mais: virou-se. E eu pude ver uma faca atravessando suas vísceras. Pingava sangue e você se contorcia de dor a cada cinco minutos.
Corri a teu encontro mais uma vez e fiz de tudo para arrancar aquilo de você. E para meu espanto, você se virou a mim e disse: não podes alterar o que já fez.
Então tornou-se um lindo anjo preto e saiu voando.
De repente, eu estava em meu quarto.
Uma pluma negra veio flutuando em direção a mim. Olhei no espelho: eu era o teu amor. E haviam quatro relógios em meu pulso.

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